sexta-feira, 6 de maio de 2016

A PROPOSTA BILÍNGUE NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

A PROPOSTA BILÍNGUE NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

O Bilinguismo, como proposta para a educação de surdos, surgiu na década de 80. Esta linha teórica defende que o aprendizado da Língua sinalizada deve preceder o da Língua oral, utilizada na comunidade a qual o surdo pertence.
Nesta proposta entende-se a Língua sinalizada como materna para o sujeito surdo, devido suas características, por primazia visual, que compensam eficazmente a falta de comunicação, situação imposta pela deficiência auditiva. A Língua sinalizada é reconhecida como L1, ou primeira Língua. Por serem as principais características das Línguas oficiais, que são utilizadas pela grande maioria nas comunidades, orais e auditivas, são entendidas nesta proposta como segunda língua para o sujeito surdo, ou L2.
A educação do surdo pela proposta bilíngüe apresenta como primordial o acesso da criança, com deficiência auditiva, à sua Língua materna, sendo de preferência a vivência e aprendizagem desta estimulada pelo contato com comunidade surda, na qual estará inserida quando maior. Seu desenvolvimento na Língua materna é considerado primordial para o aprendizado da segunda Língua (língua oral), em sua forma escrita a ser aprendida na escola.
Este trabalho visa identificar quais serviços oferta, e quais as necessidades ainda existentes, na educação bilíngüe de surdos no município de Guarapari. Tendo em vista a grande importância deste método para o desenvolvimento integral do sujeito surdo.

1. LEIS SOBRE A EDUCAÇÃO DE SURDOS NO BRASIL

A educação bilíngüe de surdos no Brasil esta amparada pela Lei e é recomendada pelo Ministério Nacional da Educação (MEC), como sendo uma proposta válida e eficaz para o ensino das duas Línguas reconhecidas pelo país, Língua Portuguesa e LIBRAS, necessárias para a inclusão social efetiva destes sujeitos.
O Decreto n° 5.626 de 22/12/2005, que regulamenta a Lei nº 10.436/2002, em seu capítulo VI, artigo 22 determina que se organize, para a inclusão escolar:
"I – escolas e classes de educação bilíngüe, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngües, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental;
II – escolas bilíngües ou escolas comuns da rede regular de ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, para os anos finais do ensino fundamental, ensino médio ou educação profissional, com docentes de diferentes áreas do conhecimento, cientes da singularidade lingüística dos alunos surdos, bem como a presença de tradutores e intérpretes de Libras – Língua Portuguesa." (NOVAES, 2010 p.73)

Ainda no artigo 22, parágrafo 1º, este Decreto descreve como escola ou classe de ensino bilíngüe “aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa sejam língua de instrução utilizada no desenvolvimento de todo o processo educativo”.
O reconhecimento pela Lei brasileira nº 10.436/2002, da LIBRAS como Língua oficial, abriu o caminho para a educação bilíngüe para os surdos e a aceitação da existência de uma “cultura surda”.

2. A CULTURA E IDENTIDADE SURDA 

Toda Língua é uma construção cultural utilizada como forma de transmissão de conhecimentos e da cultura da comunidade que a utiliza. Por isso, segundo Bagno (2003; apud NOVAES, 2010) a Língua sinalizada deve ser vista “não só como ferramenta que devemos usar para obter resultados”, ela é produtora e transmissora de cultura.
A cultura surda é definida por Strobel , como:
"O jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modificá-lo a fim de se torná-lo acessível e habitável ajustando-os com as suas percepções visuais que contribuem para a definição das identidades surdas e das almas das comunidades surdas. Isto significa que abrange a língua, as idéias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo."
(STROBEL, 2008; apud NOVAES, 2010)

A partir desta compreensão, pode-se perceber a existência de uma identidade específica e inerente ao sujeito surdo. A existência desta identidade contempla as características culturais e sociais de produção e transmissão cultural, Perlin (1998 apud SALLES, et al; 2004 p 41) divide, tendo como base os níveis de participação na comunidade surda, as características assumidas na identidade surda. São pelo autor classificadas como:

• Identidade Flutuante: quando o surdo se espelha no ouvinte, vivendo de acordo com a realidade do ouvinte;
• Identidade inconformada: quando o surdo não consegue viver de acordo com a realidade do ouvinte e se sente como tendo uma identidade subalterna;
• Identidade de transição: quando o contato do surdo com a comunidade surda não acontece na infância, o que traz um conflito cultural interno;
• Identidade híbrida: quando o sujeito nasce ouvinte e sofre uma perda auditiva, e este se utiliza para comunicar a língua sinalizada e para pensar a língua oral;
• Identidade surda: quando o surdo pôde desenvolver-se em contato precoce com a língua sinalizada e a comunidade surda, aprendendo a perceber o mundo visualmente.

3. O BILINGUISMO E A EDUCAÇÃO DE SURDOS

3.1 BASES PARA A PROPOSTA EDUCATIVA

A definição da palavra bilíngüe segundo o dicionário Aurélio: “adj. Que está em duas línguas diferentes: inscrição bilíngüe. / Onde se falam duas línguas: país bilíngüe. / Que fala duas línguas”
A proposta bilíngüe entende o sujeito surdo como participante de duas realidades, como um estrangeiro no próprio país, vivendo ao mesmo tempo a realidade da língua materna, na qual tem sua visão de mundo construída e aprimorada, e a realidade de uma segunda língua, a utilizada no cotidiano da comunidade a que pertence. Nesta proposta, o ideal para o sujeito surdo não seria a sua adequação à realidade ouvinte, usuária da língua oral, mas sim assumir sua condição de surdez como parte de suas características e identidade.
Além do caminho que a legislação brasileira abriu para a educação bilíngüe para surdos, também são bases para a proposta, documentos internacionais e teorias adotadas e divulgadas pelo MEC do Brasil.
A proposta de educação bilíngüe, "busca respeitar o direito do sujeito surdo, no que se refere ao acesso aos conhecimentos sociais e culturais em uma língua que tenha domínio" (SKLIAR, 1998 apud VICTOR, et al, 2010).
Por recomendação do MEC, o ensino de surdos no Brasil precisa ser:

"(...) efetivada em língua de sinais, independente dos espaços em que o processo se desenvolva. Assim, paralelamente às disciplinas curriculares, faz-se necessário o ensino de língua portuguesa como segunda língua, com a utilização de materiais e métodos específicos no atendimento às necessidades educacionais." (SALLES, et al; 2004 p 47)

Ainda nesta direção está a recomendação da UNESCO quanto ao direito de toda criança a aprender, na educação básica, em sua língua materna.
Para que a formação bilíngüe ocorra, é indicado que haja um instrutor surdo responsável por ensinar e transmitir a cultura surda juntamente com a LIBRAS, trabalhando em conjunto com o professor bilíngüe, ouvinte.
Segundo o manual do Atendimento Educacional Especializado para deficiência auditiva, editado pelo MEC/SEESP, este atendimento deve ocorrer por três momentos diferenciados:

• Momento do Atendimento Educacional Especializado em Libras na escola comum: em que todos os conhecimentos dos diferentes conteúdos curriculares, são explicados nessa língua por um professor, sendo o mesmo preferencialmente surdo. Esse trabalho é realizado todos os dias.

• Momento do Atendimento Educacional para o ensino de Libras na escola comum: no qual os alunos com surdez terão aulas de Libras, favorecendo o conhecimento e a aquisição, principalmente de termos científicos. Este trabalhado é realizado pelo professor e/ou instrutor de Libras (preferencialmente surdo), de acordo com o estágio de desenvolvimento da Língua de Sinais em que o aluno se encontra. O atendimento deve ser planejado a partir do diagnóstico do conhecimento que o aluno tem a respeito da Língua de Sinais.

• Momento do Atendimento Educacional Especializado para o ensino da Língua Portuguesa: no qual são trabalhadas as especificidades dessa língua para pessoas com surdez. Este trabalho é realizado todos os dias para os alunos com surdez, à parte das aulas da turma comum, por uma professora de Língua Portuguesa, graduada nesta área, preferencialmente. O atendimento deve ser planejado a partir do diagnóstico do conhecimento que o aluno tem a respeito da Língua Portuguesa.

3.2 LER E ESCREVER NA LÍNGUA PORTUGUESA

A partir da compreensão do termo bilíngüe como sendo um sujeito conhecedor e eficiente em duas línguas, o que se propõe como forma de ensino para a aquisição da segunda língua, que para o sujeito surdo é a Língua Portuguesa, é a forma escrita da língua oral ensinada a partir de sua língua materna. Isto se deve ao conceito de que o sujeito surdo interage melhor com o sentido da visão, e pelo respeito à sua condição de surdez, que dificultaria a aquisição da língua oral.
Esta preocupação quanto à necessidade do ensino da segunda língua, em sua forma escrita, se baseia na estreita relação existente entre cidadania e competência comunicativa.
Segundo Karnopp, 2005 (apud VICTOR, et al.; 2010):
"Aqui o acesso à palavra (em sinais e na escrita) é traduzido como uma forma de acesso das pessoas ao mundo social e lingüístico, sendo condição mínima e necessária para que o aluno possa participar efetivamente da aula, entendendo e fazendo-se entender."
A importância da palavra sinalizada e escrita está então, na possibilidade da comunicação sobre si.

CONCLUSÃO

Percebe-se, pela pesquisa bibliográfica apresentada, que o ensino bilíngüe é o método que mais se aproxima do respeito ao sujeito surdo em sua identidade e cultura. Assim como a preocupação, que é inerente a esta proposta, de trazer ao sujeito surdo a condição de se incluir na sociedade de forma efetiva e completa, reconhecendo suas diferenças e capacidades. Além disso, dentre as propostas para o ensino de surdos, esta é a que mais aparece, hoje, nos documentos oficiais brasileiros, sendo recomendada como modelo para as escolas inclusivas.

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